Que o outro saiba quando estou com medo e me tome nos braços sem fazer demasiadas perguntas.
Que o outro note quando preciso de silêncio e não vá embora batendo a porta, mas entenda que não o amarei menos se precisar ficar um pouco quieta.
Que, se estou apenas cansada, o outro não pense logo que estou nervosa, ou doente, ou agressiva, nem diga que reclamo demais.
Que o outro sinta quanto me dói a idéia da perda e ouse ficar comigo um pouco - em lugar de voltar logo à sua vida, não porque lá está a sua verdade, mas talvez por culpa ou acomodação.
Que, se começo a chorar sem motivo depois de um dia daqueles, o outro não desconfie logo de que é culpa dele, ou que não o amo mais.
Que, se estou numa fase menos boa, o outro seja meu cúmplice, mas sem fazer alarido, nem dizer: "olha que estou a ter muita paciência contigo".
Que, se me entusiasmo por alguma coisa, o outro não a despreze nem me chame de ingênua, nem queira fechar essa porta necessária que se abre para mim, por mais tola que lhe pareça.
Que, se eu eventualmente perco a paciência, perco a graça e perco a compostura, o outro ainda assim me ache linda e me admire.
Que o outro - filho, amigo, amante, marido - não me considere sempre disponível, sempre necessariamente compreensiva, mas aceite quando não posso ser nada disso.
Que, finalmente, o outro entenda que embora às vezes me esforce, não sou nem devo ser a mulher-maravilha, mas apenas uma pessoa vulnerável e forte, incapaz e gloriosa, assustada e audaciosa ... uma mulher!
Lya Luft
Crônica extraída do livro "Pensar é Transgredir"
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